Escola convencional ou bilíngue?
Ensino e aprendizagem
Vale a pena as crianças terem aulas em outro idioma e carga horária maior para falar uma segunda língua impecavelmente?
Rachel Campello
A necessidade de falar uma segunda língua para ter sucesso na vida profissional é indiscutível. Ciente dessa importância, o mercado oferece cada vez mais alternativas. Os cursos de línguas inovam na metodologia e, há alguns anos, surgiram escolas bilíngues, com a promessa de um ensino mais eficiente. A ideia é educar crianças e jovens em um outro idioma desde os primeiros anos de vida, para que assimilem a língua com naturalidade, em um ambiente de quase total imersão.
Uma das principais dúvidas na hora de escolher entre uma escola convencional e uma bilíngue é o medo de a segunda língua interferir no aprendizado do português. Hoje se sabe que esse risco é mínimo. "A aquisição de um novo idioma costuma ajudar as crianças a entender a estrutura da língua-mãe, facilita a assimilação de outros idiomas e até melhora o desempenho escolar, uma vez que as células cerebrais ficam mais estimuladas. A criatividade também ganha, já que esses alunos percebem desde cedo que há diversas maneiras de se expressar”, diz Bette Rodrigues Roselli, professora do curso de formação de professores de inglês para crianças e adolescentes, da PUC de São Paulo. O que pode ocorrer são pequenas confusões de ortografia, que se desfazem rapidamente. Para evitar o problema, o ideal é alfabetizar primeiro em português e, só no ano seguinte, em inglês.
A velocidade com que uma criança pequena aprende uma segunda língua é inegável. Nos primeiros anos de vida, a quantidade de novidades assimiladas e registradas pelo cérebro chega a ser impressionante. É muito maior que a capacidade de um adulto. As crianças aprendem mais rapidamente não só pelas características biológicas do cérebro, mas também por fatores psicológicos e sociais, ou seja, pelos estímulos. “De um modo geral, a criança aprende porque é naturalmente curiosa e motivada”, afirma Bette Roselli. Isso significa que, ao estar rodeada de estímulos, o aprendizado ocorre de forma rápida e natural. A criança interage e assimila o novo idioma sem se sentir obrigada ou cobrada por isso. "Ao aprender a nova língua com uma função real, que é de se comunicar naquele ambiente, ela nem percebe a dimensão do processo", diz Eliana Rahmilevitz, diretora da Stance Dual, uma escola bilíngue de São Paulo.
Fluência e Pronúncia impecáveis
Nas décadas de 60 e 70, estudantes de línguas se sentiam frustrados ao sair da sala de aula e não conseguir levar adiante uma conversa mais elaborada ou entender os diálogos de um filme. A sensação era de dinheiro e tempo jogados fora. Se o objetivo dos pais é fazer os filhos se comunicarem oralmente, as escolas bilíngues de boa qualidade dão resultado. Os alunos saem com fluência. A pronúncia é outro ganho de quem aprende uma segunda língua bem cedo. Como o aparelho fonador ainda está em formação, o sotaque fica similar ao dos nativos. Mas será que isso basta para o futuro?
Uma pesquisa conduzida na Inglaterra com 17 mil alunos que cursavam aulas de francês mostrou que, após cinco anos, os adolescentes tinham um conhecimento mais profundo das estruturas da língua e um vocabulário mais rico do que as crianças menores. Ou seja, apesar da fluência e da pronúncia, os pequenos precisariam, no futuro, mergulhar mais uma vez nos estudos.
É incontestável que passando várias horas do dia num ambiente “montado” em outro idioma o aprendizado ocorre mais rapidamente do que frequentando duas aulas semanais. Para Raquel Jelen Lam, proprietária da escola de inglês Red Balloon, em São Paulo, a fluência de um aluno de uma escola bilíngue certamente aparece mais cedo, por volta dos 10 anos de idade. Já nos seus estudantes (que pagam cerca de 300 reais mensais), essa habilidade acontece dois anos depois – período que ela considera insignificante nessa fase da vida: “Não altera nada no desempenho profissional ou escolar”, afirma Raquel, que trabalha com ensino infantil desde 1969. Muitos educadores assinam embaixo dessa teoria. Para a maioria, se não existe uma necessidade real ou uma urgência em aprender a segunda língua, como a transferência dos pais para um outro país, por exemplo, não há por que ter tanta pressa.
Mensalidades salgadas
Há ainda outros pontos a considerar ao decidir em que tipo de escola matricular seus filhos. Um deles é a maneira como as escolas bilíngues ensinam o português e outras matérias fundamentais para a aprovação no vestibular. Não se pode perder de vista que estamos no Brasil. É preciso analisar como estruturam o currículo. Muitas vezes, a escola se diz bilíngue apenas por oferecer a carga horária de um segundo idioma um pouco maior. O que não significa que os alunos fiquem imersos na outra língua.
Fora a qualidade do ensino em si, os pais precisam levar em conta o tipo de ambiente que procuram. As escolas bilíngues atraem um público de nível socioeconômico alto. As mensalidades chegam ao dobro das cobradas em colégios convencionais. Pais e filhos devem se preparar para essa realidade.
Como em qualquer outro campo da educação, os pais têm papel fundamental no aprendizado de uma segunda língua. Não é necessário que a família converse em outro idioma, mas ela precisa deixá-lo aparecer em casa. É que os pequenos aprendem com facilidade, mas também perdem o conhecimento adquirido com rapidez, caso não seja utilizado. “A criança brasileira raramente precisa usar a segunda língua, e isso pode ser muito frustrante para ela”, alerta Bette Roselli, da PUC. Para os pais que não falam o segundo idioma, a recomendação é providenciar programas de TV, filmes, músicas ou livros para os filhos.
Outra opção são as escolas internacionais, que atendem famílias de diplomatas e expatriados. A maioria segue o currículo do outro país totalmente no seu idioma, acompanha o calendário de férias e feriados de lá e, em português, oferece apenas aulas de língua portuguesa, geografia e história do Brasil. Nessas instituições, o aprendizado da segunda língua ocorre ainda mais rapidamente, pois todas as atividades são realizadas nela – inclusive a primeira alfabetização. Mas é importante ressaltar que muitas não têm uma preocupação significativa com o vestibular, já que um grande número de seus alunos deseja cursar uma universidade fora do país.
Artigo retirado de: http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/convencional-ou-bilingue-394608.shtml